Seus arquivos no Google ou SkyDrive não são tão seus, talvez no Dropbox
Pelo menos três serviços de armazenamento de dados na nuvem fizeram a cabeça dos usuários de internet nesta semana. O Google finalmente apresentou o Google Drive, serviço gratuito que sincroniza os arquivos entre os servidores da empresa e o computador do usuário. Da mesma forma, o Microsoft SkyDrive ganhou um aplicativo exclusivo para esse tipo de sincronização entre máquinas e a nuvem.
Por sua vez, a Dropbox anunciou que qualquer arquivo em qualquer pasta poderia ser compartilhado com o mundo por meio de links públicos — além disso, a empresa estreou a visualização rápida dos arquivos antes de efetivamente baixa-los, recurso que não existia anteriormente.
Com tantas ofertas de armazenamento (descubra qual é a melhor) na nuvem parece que os internautas são instados a mandar seus arquivos para uma empresa terceira, responsável por manter cópias e deixar tudo igual entre os PCs e a web, borrando a fronteira entre o que é seu e fica na sua máquina com o que é seu, mas fica em outra máquina.
Talvez a maior preocupação para muitos seja a privacidade e a segurança dos dados. Todas as companhias afirmam tomar o maior cuidado possível, embora se isentem de eventuais responsabilidades caso os arquivos se percam. Já a questão sobre a quem pertencem os arquivos continua bastante polêmica.
Eu conversei com Sergio Branco, professor do curso de graduação de Direito da Fundação Getúlio Vargas (FGV) no Rio de Janeiro, sobre o assunto em questão. O professor, com mestrado e doutorado em Direito Civil pela Universidade Estadual do Rio de Janeiro (UERJ), fez comentários sobre os termos de serviço do Google, da Microsoft e da Dropbox considerando o que a legislação brasileira atual — ainda que capenga — prevê.
Partindo do pressuposto de que os termos de uso para serviços do Google são unificados, o professor entende que a situação ficou ainda mais grave com a chegada do armazenamento na nuvem por meio do Google Drive. Os termos do Google preveem uma série de ações que, na opinião de Branco, não são coerentes com o início do documento, no qual a empresa afirma que utiliza os dados apenas para manter os serviços funcionando da maneira correta.
— O que chama a atenção é a licença prever a reprodução, modificação, exibição, distribuição e criação de obras derivadas. Nós interpretamos isso como um absurdo. Muitos destes arquivos foram criados pelo usuário. É inacreditável que essa condição conste dos termos de serviço.
De acordo com Sergio Branco, os termos especificamente do Google tentam conferir tranquilidade no que se refere à privacidade do usuário ao afirmar que o usuário “mantém a propriedade de quaisquer direitos de propriedade intelectual” em arquivos enviados por ele. Entretanto, o documento vai ao sentido contrário ao reservar para o Google tantas permissões.
A situação se repete nos termos de serviço do SkyDrive da Microsoft. Consta do documento que o usuário “concede à Microsoft o direito de utilizar, modificar, adaptar, reproduzir, distribuir e exibir o conteúdo publicado no serviço”, ainda que isso se dê “exclusivamente na extensão necessária para fornecer o serviço”.
— É claro que não vão sair por aí publicando os arquivos. Porém, a priori, tais serviços são utilizados para backup, não para tornar os documentos públicos. Os termos de uso não fazem sentido para um serviço de backup e armazenamento de dados na nuvem.
O maior problema fica por conta da redação do texto, de acordo com professor, que dá aulas de “Contratos Jurídicos” e de “Direito, Linguagem e Interpretação” na fundação. Por mais que as empresas não tenham interesse em reclamar para si os arquivos, em tese e em face ao que o termo de serviço diz, elas podem fazê-lo.
Sergio Branco sugere que a redação dos compromissos de uso receba a inclusão de uma frase similar a “sempre que eu expressar claramente desta forma”.Google, Microsoft e similares deveriam incluir também, nos aplicativos e na interface do serviço para web, uma caixa na qual o usuário marca que autoriza, por exemplo, o compartilhamento de um arquivo com outros contatos, abrindo mão da privacidade do documento para que os demais obtenham acesso a ele.
— Assim ficaria na esfera do direito do autor. Você faz o upload e diz se quer e como quer que a empresa lide com seus arquivos.
Dropbox
Podemos dizer que a Dropbox utiliza termos de uso menos invasivos à privacidade do usuário. No início do documento lê-se que o internauta “fornece as informações, arquivos e pastas enviadas para a Dropbox” e que esse usuário “possui a total propriedade das coisas. Nós não reclamamos a posse de nada disso”. O professor aponta que a redação está melhor que a dos concorrentes por dizer que “podemos necessitar da sua permissão para fazer coisas que você nos pede para fazer com as suas coisas, como por exemplo, armazenar os seus arquivos ou compartilha-los”.
É altamente improvável que as empresas de internet utilizem os dados do usuário sem o seu consentimento. Ainda assim, os esclarecimentos do professor Sergio Branco atestam que, do ponto de vista legal, essa possibilidade existe.
— Não é o caso de ficar desesperado ou encerrar a conta nesses serviços. Mas eu tomaria cuidado com aquilo que eu mando para os servidores dessas empresas.
Falta legislação
O professor Sergio Branco aponta que faltam leis que se apliquem especificamente ao ambiente de internet ou que complementem as atuais no sentido de orientar o internauta brasileiro. Branco diz que passou da hora de termos esclarecidos quais são os direitos e os deveres de quem utiliza a internet. Os Estados Unidos já mostraram que o caminho pode ser contrário ao que a sociedade espera, em referência aos projetos de lei que frequentemente chegam ao congresso americano tentando regulamentar a rede.
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